Um dos temas que recorrentemente aqui tratámos foi a comunicação mediática. A histeria comunicativa, perdoe-se-nos a contradição dos termos, que se desenvolveu em torno dos ídolos futebolísticos chegou a raiar o absurdo. Nas últimas semanas ficámos a saber a que horas a selecção tomou o pequeno-almoço, as pequenas actividades a que os jogadores se entregavam nos tempos livres, bem como as deslocações que tiveram que fazer, horas de partida, de chegada e eventuais percalços da viagem.
Fomos também brindados com entrevistas que tentavam avançar o impossível: como correria o jogo, se se ia ganhar ou perder. Esta actividade tem ganho prestígio nos últimos tempos. As declarações anteriores aos jogos fornecem ensejo para os mind games, em que os duplos sentidos e o não dizer que amplia o dizer, se transformaram em arte. No entanto, este suposto espaço em que se poderia expressar uma genialidade verbal não passa, em muitos casos, da arrogância e inconsequência. Assistimos a jovens, acabados de sair da sua adolescência, deslumbrados com o dinheiro e atenção mediática que sobre eles se centra, a ter atitudes deselegantes, frutos de uma vaidade sem par.
A educação para a saúde chama a atenção para a importância dos ídolos na adopção de comportamentos e estilos de vida…. Mas são estas figuras que se vendem a quem pagar mais, que publicamente reconhecem lealdade a um clube e depois a outro, os modelos dos nossos filhos. Em muitos meios, especialmente no futebolístico, o dinheiro substituiu muitos códigos de ética como os que se organizam em torno de valores como a honestidade, a lealdade e a coerência. Não nos esqueçamos da visibilidade que estes comportamentos têm…
Como lutar contra este Golias? Que força a escola pode ter contra desta desinformação? E os que se preocupam com a saúde mental dos jovens e tentam promover programas de desenvolvimento pessoal? Por estes dias ouvimos a uma criança a seguinte frase: “Ó pai, Portugal está a falar…” O sincretismo e a ingenuidade infantil mostram bem o poder que as declarações e o comportamento destes jogadores podem ter sobre os mais novos.
Quanto a nós, ficámos longamente a meditar sobre uma frase de Quaresma: “já não tenho mais que fazer em Portugal”.
O Primeiro de Janeiro, 9 Julho 2008.
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