Diversas disciplinas científicas, e mais precisamente as práticas clínicas que nelas se baseiam, têm vindo ao longo das duas últimas décadas a refletir sobre as questões da adesão ao tratamentos. De facto, se o indivíduo recebe uma perscrição ou indicação salutogénica, por que motivo é que não a segue?
A reflexão científica passa agora pelas questões de comunicação em consulta. Qual a melhor forma de comunicar? Quais os ruídos e interferências que essa comunicação sofre mais frequentemente? A psicologia da saúde tem vindo a desenvolver diversas investigações sobre estes assuntos. Já a psicologia clínica reflete sobre as mais eficazes formas de atender os clientes desde há longas décadas. Lembramo-nos de Carl Rogers, mas também Ivey, Miller ou Rollnick com a sua entrevista intencional e motivacional – respetivamente.
É claro que é preciso saber comunicar e ter instrumentos para nos lermos a nós próprios, profissionais de saúde, quando em interação com os doentes. Ir um pouco mais além do que isto é pensarmos também na forma de funcionamento cognitivo e afetivo das pessoas que atendemos.
Para isso, precisamos novas grelhas teóricas. Queremos dizer: não se trata apenas de nos abrirmos às vivências subjetivas dos doentes e detetar regularidades nessas vivências, mas também às formas como eles se organizam internamente. Referimo-nos não só às vivências das doenças do foro mental, bastante exploradas, mas também às patologias do foro físico ou organísmico.
Assim, patologias como a hipertensão ou a forma como é experienciada certa intervenção cirúrgica, podem relacionar-se com certas dimensões psicológicas mais específicas. Claro que este conhecimento é fundamental para os profissionais se poderem situar face ao aqui e agora destes doentes que atendem. Neste campo a bibliografia tem vindo a ser crescente.
Outra dimensão mais profunda, e que continua esta linha de esforço, tem que ver com a própria expressão verbal dos doentes atendidos. Certas cognições irracionais ou justificações incongruentes podem ser, se os profissionais de saúde estiverem para isso sensibilizados, detetados e intervencionados. Em vez de interpretar as resistências como má-vontade ou desinteresse por parte do doente, seria mais profícuo encará-las como formas de comunicação.
Concretamente: os doentes estão a comunicar-nos a sua dissonância ou contradição interna.
(originalmente publicado aqui)
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