A autoria é, entre muitas outras coisa e sob o ponto de vista social, a capacidade de uma cultura ligar um produto – texto, música, pintura… – a uma pessoa.
Na literatura oral essa ligação era bastante instável: os textos apresentavam variantes, o autor era anónimo ou obscuro (veja-se Homero). O desenvolvimento da imprensa e do livro impresso acabou por alargar esse luxo da autoria a um número crescente de pessoas. Assim. a obra pode ser situada no interior de um devir do autor ou, se quisemos, de uma subjetividade diferente da nossa – no fundo, de um Outro.
Em termos tecnológicos multiplicaram-se os instrumentos que facilitam a criação: programas de escrita, produção de áudios e música, de filmes e pequenos relatos.
O armazenamento é quase infinito e a informação reproduz-se quase por milagre. Paradoxalmente esta aceleração tecnológica pode enfraquecer esta ligação autor-obra produzida desde há aproximadamente quinhentos anos.
E como isso se opera?
O texto é copiado em segundos e reproduzido noutro lugar. Nesse lugar juntam-se fragmentos de textos oriundos de diversas proveniências. Tudo é reinvestido de outra autoria – nova subjetividade… ou será que não?
Dirão muitos, chegados a este momento, que o que acabámos de referir não tem nada de novo e denomina-se plágio. Em muitos casos terão razão. Mas refiro-me a um novo contexto tecnológico que impõe novas formas de pensar. Quase um novo planalto de imanência, se quisermos.
A internet e os meios tecnológicos associados permitem a manipulação da obra do outro como um objeto que pode passar a ser uma nova letra de um diferente alfabeto.
Assim, curiosamente, a internet cria um caldo de informações e práticas que geram um contexto próximo à da literatura oral.
As obras multiplicam-se e emergem variantes. Se quisermos, poderemos encarar isto como uma reautoria – já abordámos noutro lugar.
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